terça-feira, 30 de outubro de 2012

Morto por PM no Rio. Causa estouro de um pneu

 

'Não dou 30 dias para matarem outro', diz pai de jovem assassinado por PM

Foto: Fábio Gonçalves / Agência O Dia

Robson ( esquerda) e Raunir (direita) são irmãos da vítima e estavam no carro | Foto: Fábio Gonçalves / Agência O Dia

Rio -  O corpo de Rafael Costa foi enterrado nesta segunda-feira à tarde no Cemitério de Irajá. Cerca de 350 pessoas, entre amigos e familiares, participaram do cortejo, marcado por muita emoção e revolta.
Muito abalada, a mãe do jovem, Rosana Thomas da Costa, desmaiou durante o velório. Pai de Rafael, Valmir não poupou críticas à PM do Rio.
“Eles têm que passar por uma reciclagem. Muitos não sabem manusear um fuzil. Mataram meu filho e eu não dou 30 dias para matarem outro”, disse Valmir.

Foto: Carlo Wrede / Agência O Dia

Rosana, mãe do rapaz fuzilado, momentos antes de desmaiar no enterro | Foto: Carlo Wrede / Agência O Dia

Ele questionou ainda a falta de apoio das autoridades: “Mesmo com a grande repercussão, ninguém nos procurou. O comandante disse que era lamentável. E se fosse o filho dele? Seria lamentável também?”.
Irmão de Rafael, Raoni, 16, gritou no funeral: “O cara está preso, bebendo água, e meu irmão, morto”. Após o enterro, houve protesto na Estrada do Quitungo, altura da Vila da Penha.

Som de estouro levou à morte

O som do estouro de um pneu pôs fim ao sonho de Rafael Costa da Silva, de 17 anos, de tornar-se salva-vidas do Corpo de Bombeiros.
Ele foi morto com um tiro de fuzil no pescoço, em Cordovil, pelo sargento Marcio Perez de Oliveira, de 36 anos, do 16º BPM (Olaria), que confundiu o barulho e abriu fogo contra o carro onde a vítima estava com outras cinco pessoas. Perez acabou preso e vai responder por homicídio doloso (quando há intenção de matar).

Foto: Fábio Gonçalves / Agência O Dia

Rafael Costa, 17, dirigia o carro da mãe quando foi baleado e morreu | Foto: Fábio Gonçalves / Agência O Dia

O comandante-geral da PM, coronel Erir Ribeiro Costa Filho, classificou o fato como ‘lamentável’ e afirmou que ‘os policiais só devem atirar quando há segurança, já que a principal missão da corporação é a preservação da vida’.
Pai de Rafael, Valmir Miguel da Silva, 53, acusou ainda um PM de colocar o dedo no ferimento do filho para tentar achar o projétil, além de desfazer a cena do crime.
“Foi uma covardia. O policial tinha que ter parado para ajudá-los, mas eles atiram antes de perguntar ou pedir para parar”, desabafou o pai, que é motorista da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e tem outros cinco filhos, sendo que dois deles, Raunir e Róbson Fernandes, de 17 e 19 anos, estavam no carro.
“Eles (PMs) não atiraram nem para o alto. Já vieram com fuzil pra cima da gente”, corroborou Róbson.
Na Divisão de Homicídios (DH), onde o caso é investigado, o sargento Marcio Perez confessou que confundiu o som do pneu com o de um tiro e disparou apenas duas vezes, embora o veículo estivesse com quatro marcas de bala (na coluna da porta do motorista, que atingiu Rafael; próxima ao para-lama direito; no vidro traseiro; e no vidro lateral esquerdo).
O policial foi encaminhado à Unidade Prisional de Benfica, antigo Batalhão Especial Prisional (BEP). Todas as armas dos policiais foram apreendidas e serão periciadas. Os investigadores também confirmaram que o disparo que acertou o estudante partiu do local informado pelo PM. Dez pessoas, entre elas os oito policiais, já foram ouvidas.

Foto: Alessandro Costa / Agência O Dia

Pneu do Fiat Idea da mãe da vítima estourou quando veículo caiu num buraco na Estrada Porto Velho, em Cordovil | Foto: Alessandro Costa / Agência O Dia

Na hora do tragédia, Rafael, que completou 17 anos recentemente, estava acompanhado dos irmãos por parte de pai e outros dois amigos, Rafael e Felipe — este chegou a ser atingido por estilhaços, mas passa bem.
Segundo Valmir, a mãe do rapaz, Rosana, havia emprestado o Fiat Idea para que ele fosse da Penha Circular, onde morava, até Cordovil, onde iria encontrar a namorada.

Advogado diz que família quer processar o Estado


De acordo com o advogado da família, Marcelo Branco, a intenção dos pais de Rafael é processar o Estado. Irmão da vítima fatal, Róbson Fernandes fez críticas à ação desastrada dos policiais militares:
“Não me lembro de nada, só ouvi os tiros. Saí do carro e me identifiquei como militar do Exército. Os outros também saíram, e fomos obrigados a deitar no chão. Vi o policial mexendo no meu irmão baleado dentro do carro. Eles encostaram a viatura para socorrê-lo. Aí eu disse: ‘Meu irmão não vai na caçapa, não. Ele não é bandido’. A população também não deixou que tirassem ele do carro”, relatou.
Valmir Miguel, pai do jovem morto, contou que, no local, um dos policiais, pelo telefone, avisava a seu interlocutor que caso alguém questionasse o que teria ocorrido, a informação que deveria ser passada era de troca de tiros. Além disso, disse ter sido vítima da ironia dos PMs, que debocharam da situação.

Perto da faixa-preta de boxe tailandês


Estudante do último ano do Ensino Médio, Rafael Costa era vice campeão brasileiro de boxe tailandês, segundo contaram amigos e familiares, e estava prestes a pegar a faixa-preta desta luta, conhecida mundialmente como muay thai.
“Poderia ter perdido três irmãos numa noite só. Não é a prisão do policial que vai tirar isso de mim, ainda me lembro do meu irmão caído no carro. Perdi um companheiro, uma pessoa que todo mundo gostava”, completou outro irmão da vítima, Rômulo, 22, na porta do Instituto Médico-Legal (IML), em São Cristóvão.
Rafael dirigia o Fiat Idea da mãe, na companhia de outros dois irmãos paternos e dois colegas, quando, ao passar por um buraco, furou o pneu. Encurralado por duas viaturas, ocupadas por oito PMs, os disparos começaram repentinamente.

POR FELIPE FREIRE / MARCELLO VICTOR / PALOMA SAVEDRA

http://odia.ig.com.br/portal/rio/n%C3%A3o-dou-30-dias-para-matarem-outro-diz-pai-de-jovem-assassinado-por-pm-1.508919

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